A saúde das pessoas atingidas pela Vale para além das questões médicas

No Dia Mundial da Saúde, o Guaicuy propõe uma reflexão sobre a diversidade de danos de ordem física e mental que foram provocados pelo rompimento da barragem da Vale no Rio Paraopeba e na região do Lago de Três Marias 

Conteúdo feito com a colaboração da equipe de Saúde e Assistência Social

De que forma um rio com menos peixes fala sobre a saúde de uma comunidade? Como a falta de acesso à água de qualidade pode interferir na alimentação de uma família? Emprego e moradia digna podem ser considerados fatores relevantes para uma pessoa ser saudável? De que maneira a manutenção dos nossos laços sociais e familiares garantem uma vida com menos doenças?

Pensar em um conceito ampliado de saúde, que vai além das questões médicas, é uma reflexão válida para este 7 de abril, quando é comemorado o Dia Mundial da Saúde. A data é celebrada desde 1948, por definição da Organização Mundial da Saúde. 

Esse debate está  presente no dia a dia da equipe de Saúde e Assistência Social do Instituto Guaicuy, que atua como Assessoria Técnica Independente em Curvelo e Pompéu (área 4) e em oito municípios da região do Lago de Três Marias (área 5), cujas comunidades foram atingidas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho. 

A equipe realiza acolhimento psicossocial das pessoas atingidas com o intuito de ofertar escuta qualificada,  levantar danos relacionados à saúde e trabalhar a participação informada no contexto de discussão sobre todo o processo de reparação integral. A realização de ações coletivas nas comunidades atingidas também é uma estratégia para consolidar uma leitura detalhada sobre as mudanças trazidas pelo desastre.

Após três anos e quatro meses, os danos à vida da população da Bacia do Paraopeba e do Lago de Três Marias seguem se alastrando em vários níveis, afetando a saúde e provocando adoecimentos físicos e sofrimento mental.  Sendo assim, é urgente o entendimento sobre o conceito de saúde para se pensar em uma reparação justa para estas pessoas. 

“Ter saúde não é não ter doença. É sentir-se bem e ter acesso ao meio ambiente ao seu redor. É ter condições financeiras para suprir as atividades básicas e de lazer. É poder conviver com a família e com os amigos. É ter uma rede de apoio. Ter saúde é também ter liberdade de escolha para ter o seu próprio modo de vida e realizar seus projetos e sonhos”, explica a coordenadora da equipe de Saúde e Assistência Social do Guaicuy, Paula Mota Junqueira. 

Para a coordenadora, a série de danos causados pelo rompimento nas comunidades atravessa a vida de forma significativa. Os sonhos e projetos das pessoas atingidas foram interrompidos e continuam sendo afetados depois de 39 meses. Entre outras coisas, muitas pessoas relatam ao Guaicuy dificuldades de ter um local para criar os filhos e netos com segurança, falam da necessidade de viver de produção agrícola e da pesca e mencionam a vontade de usufruir de um meio ambiente saudável.

Os danos impactam ainda na alegria, na qualidade do sono, na segurança, gerando casos de depressão, problemas de pele, aumento da pressão arterial, problemas respiratórios, entre outros – além do agravamento de outras doenças existentes.

Quando se considera os danos à saúde das pessoas atingidas provocados pelo rompimento,  é necessário entender que esses danos podem ocorrer em curto prazo, mas também ao longo dos dias, anos e décadas que virão pela frente. Assim é necessário o fortalecimento da vigilância à saúde da população atingida.  

Nestes quase dois anos de atuação, a Equipe de Saúde e Assistência social do  Guaicuy  realizou aproximadamente mil acolhimentos psicossociais, que se desdobraram em encaminhamentos e discussões com os serviços públicos de saúde e assistência social das comunidades nesse período, a equipe também participou de diversas outras ações coletivas com as demais áreas da ATI. 

Além disso, realizou uma análise da situação de saúde da população atingida, que contou com levantamento de dados secundários dos sistemas de informação do Sistema Único de Saúde (SUS) e com entrevistas realizadas com as pessoas atingidas, com gestores municipais de saúde e com profissionais de saúde. Os resultados da Pesquisa Saúde estão sendo organizados e serão divulgados em breve para as comunidades atingidas e para a sociedade civil. 

A saúde é um direito universal garantido a todos os brasileiros por lei e, mesmo assim, a falta de acesso a ela continua sendo uma das principais questões sociais do Brasil. Garantir que as pessoas atingidas pelo rompimento da barragem da Vale tenham acesso a ela é uma das principais prioridades de um processo de reparação justo. 

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