Nuvem de poeira da mineração gera mais de 100 denúncias em distrito de Ouro Preto

Pessoas de Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto, enviaram vídeos e fotos para a Assessoria Técnica Independente, que protocolou ofício no Ministério Público

Há mais de dez anos a comunidade de Antônio Pereira, distrito de Ouro Preto/MG, vem sofrendo com a poeira intensa, causada pela mineração praticada pela Vale na Barragem Doutor. As denúncias foram enviadas por moradores de diferentes regiões do distrito. 

As fotos e vídeos mostram a nuvem de poeira de minério que sai da barragem, das obras de descomissionamento e invade as ruas e casas, causando danos nas residências, especialmente, à saúde das pessoas, que cobram análise da composição química da poeira, uma vez que ela atinge a pele e os pulmões.

“O poder judiciário precisa saber que (a poeira) afeta todo nosso sistema respiratório, causa um estresse enorme em toda comunidade. Que a Vale não tem sido responsabilizada por todas as nuvens de poeira que já ocorreram. Nós precisamos de dados concretos de quais são as composições químicas dessas partículas que nós estamos aspirando, causando alergias de pele”, argumenta Ana Carla Cota, atingida pelas obras da barragem. 

Imagens registradas no dia 20 de agosto de 2023 em Antônio Pereira (MG) 

O Instituto Guaicuy, organização não governamental que atua como Assessoria Técnica Independente das pessoas atingidas pela Barragem Doutor, em Antônio Pereira, já recebeu centenas de denúncias sobre a poluição e os danos à saúde causados pela poeira. Diante disso, protocolou uma denúncia (Notícia de Fato) no Ministério Público de Minas Gerais sobre o caso no dia 14 de julho de 2023. 

A mineradora Vale, responsável pela Barragem Doutor, se manifestou alegando que o levantamento de poeira se deu por causa de fortes ventos que atingiram a região, em função de um ciclone extratropical e frente fria que atingiram o Sul do Brasil e Minas Gerais no dia 12 de julho de 2023. O Ministério Público acatou a alegação da Vale e arquivou a denúncia. No entanto, o Instituto Guaicuy entrará com recurso, anexando as novas imagens, vídeos e áudios recebidos, após denúncias recebidas no domingo (20/08), quando uma nuvem de poeira cobriu parte do distrito. 

Imagens registradas no dia 20 de agosto de 2023 em Antônio Pereira (MG)

Camila Bento, coordenadora da equipe de Direitos e Participação Social da ATI Antônio Pereira, acrescenta que o Guaicuy está tomando todas as providências para apresentar ao Ministério Público as informações trazidas pelas pessoas atingidas, solicitando o desarquivamento e a consequente continuidade da Notícia de Fato. 

Outra frente de ação do Instituto é se reunir com órgãos públicos competentes, especialmente os de saúde e de defesa dos direitos dos atingidos. A Barragem Doutor, está em processo de descomissionamento, mas a poeira excessiva já afetava os moradores do distrito quando a barragem estava ativa. O problema foi potencializado a partir das obras de descomissionamento, iniciadas em 2020. A população de Pereira cobra ações de mitigação para evitar que novas nuvens de poeira tomem conta do distrito. “Mais importante que bens materiais, é a nossa saúde. Essa poeira que a gente respira de minério vai pra dentro do pulmão da gente”, lamentou um morador da comunidade que pediu para não ser identificado. 

Imagens registradas no dia 20 de agosto de 2023

Problema fica mais grave no segundo semestre

Nos últimos três anos, os moradores alegam haver um aumento desses resíduos. As casas ficam tomadas pela espessa camada de um pó fino, cinza, brilhante – diferente da característica poeira de terra vermelha que é comumente encontrada em diversas regiões de Minas Gerais nesta época do ano, quando a estiagem torna o problema mais grave. 

“Esse é um problema crônico. E um dos pontos que delegou o Guaicuy a ser escolhido pela comunidade como ATI foram eventos relacionados ao alto índice de poeira desde os anos de 2010, quando a população já reclamava no período de construção da Barragem Doutor”, acrescenta Ronald Guerra, coordenador-geral da ATI Antônio Pereira e vice-presidente do Guaicuy.

As denúncias enviadas ao Instituto Guaicuy são uma tentativa da população de buscar soluções para o problema que, segundo os moradores, é a causa de danos à saúde como dificuldades respiratórias em pessoas sem quadros de comorbidade, ressecamento das vias aéreas, agravamento de asma e bronquite, coceira, ardência nos olhos, incessante necessidade de limpeza das residências, impregnação do resíduo em roupas, janelas, pisos e até mesmo em animais domésticos.

“Minha garganta está bem ruim depois daquela poeira gerada pela Barragem do Doutor ontem (20/08). Essa não é primeira vez que isso acontece aqui na Vila Samarco (situada em Antônio Pereira), essa situação já nos perturba tem bastante tempo, posso dizer que faz quase 10 anos. Não tem casa que fique limpa, a pelagem dos meus cachorros estão brilhando por causa daquela poeira de minério, meus olhos estão ardendo desde ontem, minha garganta está parecendo que está cheia de pó (ressecada), tinha lavado o carro no sábado, agora dá até para desenhar nele. A roupa de cama fica toda brilhando; a gente deita na cama e fica com o corpo todo coçando”, relata o morador que pediu para ter a identidade preservada.  

Além de reportar para a ATI os prejuízos causados pela poeira, a Associação de Moradores da Vila Samarco oficializaram, na tarde desta terça-feira (21/08), a denúncia na Polícia Militar de Meio Ambiente na cidade de Mariana.

Os danos causados pela poeiras já foram notícia em 2013

Por Mariana Viana

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