Previsto no acordo assinado entre a Vale, as Instituições de Justiça e o Estado em fevereiro deste ano, o microcrédito foi proposto dentro dos Projetos de Demandas das Comunidades Atingidas que compõem o anexo 1.1. Para tais projetos, estão previstos R$ 3 bilhões, dos quais, pelo menos, R$ 1 bilhão deve ser destinado a projetos de crédito e microcrédito para as pessoas atingidas.
Estes projetos estão dentro do escopo do programa de reparação socioeconômica e, tendo em vista este assunto, o Instituto Guaicuy encaminhou para as Instituições de Justiça (IJs), no último dia 20 de abril, um documento que contém, dentre outros pontos, uma proposta sobre crédito popular solidário, referente ao Microcrédito.
Segundo pesquisa intitulada “O papel do microcrédito como gerador de renda”, desenvolvido por Francisco Ferreira (2018), o microcrédito é “crédito de pequeno valor destinado às pessoas que se encontram abaixo ou próximo da linha de pobreza e que não têm acesso às linhas de crédito tradicionais”.
Desde a assinatura do acordo, no dia 04 de fevereiro, o Guaicuy deu início aos estudos sobre o termo e fez os primeiros contatos com outras entidades e iniciativas de Cooperativas de Crédito, Bancos Comunitários e Fundos Solidários, a fim de entender como poderá se efetivar a criação de sugestões para implantação do microcrédito nos territórios atingidos e prejudicados. O intuito do documento é apresentar possibilidades de instrumentos para operar o microcrédito, a serem discutidos com as pessoas atingidas, onde as comunidades vão poder atuar de forma deliberativa, ou seja, através do voto.
Para Pedro Andrade, da Equipe de Direitos dos Atingidos, a participação das pessoas atingidas é fundamental. “Vamos apresentar os estudos que iniciamos para as pessoas atingidas para mostrar que há outras formas de ser feito o microcrédito que não apenas daquele jeito tradicional, ou seja, por meio dos grandes bancos. A ideia é que elas mesmas decidam sobre o que é melhor para o território”, explica.
Após as rodadas de consultas com as comunidades sobre os Programa de Transferência de Renda (PTR – anexo 1.2) e Projetos para Bacia do Paraopeba (anexo 1.3), que estão acontecendo neste mês de abril, o Guaicuy pretende debater os estudos preliminares que foram iniciados em fevereiro deste ano para que juntos, comunidades e Assessoria Técnica Independente, possam discutir as possibilidades acerca do microcrédito.
Enquanto ATI, o Guaicuy está disponível para assessorar a comunidade e contribuir na sistematização das propostas a serem encaminhadas para o Comitê de Compromitentes (formado pelas Instituições de Justiça e Estado de MG).
Conheça experiências de economia popular solidária pelo país
O documento encaminhado para as IJs pelo Instituto Guaicuy, trata de uma proposta pautada na Economia Popular Solidária que, por sua vez, tem o propósito de gerar um envolvimento e uma participação maior das pessoas atingidas.
Ao contrário do microcrédito tradicional, a perspectiva de finanças solidárias visa a participação e gestão comunitária. Levantamento realizado pelo Guaicuy aponta que hoje existem no Brasil 118 bancos comunitários, que compõem a Rede Brasileira de Bancos Comunitários. Outra alternativa dentro deste modelo são as cooperativas de crédito, bem mais antigas no cenário brasileiro.
Roseny de Almeida, da equipe de Mobilização Social e Metodologias Participativas do Instituto Guaicuy, tem 20 anos de experiência com economia popular solidária e comenta: “esta é uma grande oportunidade das pessoas atingidas fazerem a gestão de forma coletiva desse R$ 1 bilhão de reais. Ao constituir uma Cooperativa de Crédito ou um Banco Comunitário Solidário com esse dinheiro, poderão acessar estes recursos com taxas de juros muito mais baixas do que nos bancos tradicionais, que existirá apenas para não desvalorizar este ‘fundo coletivo’ que será criado.”
No estudo elaborado pelo Instituto, na perspectiva da Economia Popular Solidária, há pelo menos três modalidades de implantação de Finanças Solidárias: Cooperativas de Crédito, Bancos Comunitários Solidários e Fundos Rotativos. Todas têm o objetivo de promover o acesso ao crédito para pessoas vulneráveis e de estimular o desenvolvimento local e sustentável das comunidades com participação efetiva das pessoas.
As pesquisas realizadas pelo Guaicuy apontam algumas experiências de sucesso tais como o Banco Palmas (experiência pioneira, criada em 1998 no Ceará), o Banco Bem (no Estado do Espírito Santo) e o Banco Comunitário Cumbuca (em Maricá, Estado do Rio de Janeiro). Em relação às Cooperativas de Crédito, é citado o Sistema de Crédito Cresol (1995), dentre outros.
Além disso, existe também uma outra modalidade, que são os Fundos Rotativos, eles não exigem a criação de uma nova entidade. Essas são experiências bem sucedidas no país, aprovadas pelo Banco Central, e que podem servir de parâmetro para operacionalizar o microcrédito previsto no acordo.
Nas próximas semanas, seguindo o cronograma de consultas às pessoas atingidas e prejudicadas pelo rompimento, o Guaicuy deve intensificar o diálogo com as comunidades sobre as possibilidades de aplicação do programa de Microcrédito.