Adelson Oliveira conta, em relato emocionante, o que significou o fechamento da única unidade de ensino municipal de sua região
Sou Adelson Oliveira, operador de máquinas. Moro com minha esposa, Fernanda, e meus dois filhos, Cauã e Tauane em Veredas, um pequeno arraial no município de Abaeté. A vida aqui é simples. É vida de roça. De criança correndo com pé na terra e a gente trabalhando pra ter uma vida digna, feliz. Cresci e estudei na Escola Municipal de Veredas, um lugar especial demais da conta pra mim, pois ali é um ponto de encontro na história da minha gente.
Foi lá onde minha avó, hoje com cem anos, minha mãe, hoje com 77 anos, eu e meus filhos aprendemos a ler e a escrever. Eu conto isso com a certeza de não ser pouca coisa. Lá a gente jogou muita bola, brincou e correu, cada um no seu tempo da infância. Lá a gente encontrava uns com os outros, fazia festa, e conhecia gente nova. Lá era onde morava nossa educação. E educação, pra mim, é futuro.
A escola é quase centenária. Ela recebe cerca de 30 crianças de várias comunidades ao redor daqui: Riacho das Areias, Balsa, Porto de São Vicente, Aldeia e as fazendas da região. Foi então que, em novembro do ano passado, chegou o prefeito, junto da secretária de educação. Eles vieram nos avisar que uma lei estadual tinha determinado o fechamento da nossa escola, e que, a partir desse ano, as crianças teriam que ir até um outro lugar, percorrendo mais de 100 quilômetros por dia, para poderem continuar estudando. Eu me revoltei com essa notícia, achei um absurdo, pois a nossa escola está em plenas condições de funcionamento.
O ano começou e assistimos nossas crianças tendo que dedicar mais de duas horas do tempo de brincadeira delas pra ficar dentro de um ônibus, indo e voltando em estrada de terra da nova escola, que fica distante. Teve caso de criança fazendo xixi na roupa, porque a viagem era longa, e também das que não queriam ir pra aula, preferindo ficar em casa do que percorrer um caminho tão maçante diariamente, sendo que antes a escola era aqui do lado.
Afinal, que lei era essa que mandava fechar nossa escola sem motivo? Fomos saber melhor, pesquisando com a ajuda de pessoas que entendem mais desse assunto, e descobrimos que ela não existia. Peguei minha moto, paguei do meu bolso a gasolina, e fui percorrer as comunidades onde moram os estudantes da nossa escola. Conversei com cada família, expliquei que existia, sim, um jeito de reverter a situação, caso a gente se juntasse.
E aí consegui recolher mais de 120 assinaturas contra o fechamento da escola. Levei na Câmara dos Vereadores, conversei com alguns que me deram mais atenção e pedi que eles direcionassem para o Ministério Público nossa demanda coletiva. Nossa denúncia. Não é direito de todos ter educação? Então queremos isso pro nosso povo também, e que não seja preciso viajar, colocar as crianças em situação de perigo e desconforto, para que elas possam estudar e serem alguém na vida.
E assim, com paciência e firmeza, a gente conseguiu uma reunião com o prefeito, na qual ele nos prometeu a reabertura da escola. Sei que foi preciso um esforço da nossa parte, de correr atrás da informação sobre nossos direitos, de conversar com os políticos que nós mesmos pusemos lá pra nos representar, e pedir para que olhem pros nossos problemas. Sei também que muita gente pensa que por sermos humildes, vamos aguentar tudo calado, mas estamos aí para mostrar o contrário. Sabemos muito bem o que nos importa.
Era para ter acontecido no mês passado, mas adiaram para agora, no começo de junho, a reabertura da nossa escola. Infelizmente, não vai ser mais até o quarto ano, como era antes, mas o prefeito se comprometeu a garantir ensino até o segundo período. Mas estaremos aqui, na vigília, para poder ver aquelas portas se abrindo de novo e o barulho da criançada brincando, estudando e vivendo, como precisa ser.