Audiência pública debate saúde das crianças atingidas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho

A Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) realizou audiência pública nesta quarta-feira (7/12) para debater a contaminação de famílias, incluindo adultos e crianças, nas comunidades de Brumadinho, por chumbo, arsênio, manganês, mercúrio e cádmio em razão da atividade minerária e dos crimes cometidos pela Vale na região.

A audiência foi convocada pelos deputados Leninha (PT) e João Vítor Xavier (Cidadania) e contou com a presença de uma série de convidados, como o bispo auxiliar de Belo Horizonte, Dom Vicente de Paula Ferreira, e a Coordenadora do Observatório em Desastres da Mineração: gestão em riscos e Direitos Humanos do Instituto René Rachou – Fiocruz Minas, Zélia Maria Profeta da Luz.

Contaminação

A deputada Leninha começou a audiência chamando a atenção para o fato de ela ser fruto de mobilização e contestação por parte das pessoas atingidas da região de Brumadinho com relação aos resultados da pesquisa feita pela Fiocruz, em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Segundo a deputada, os resultados não divergem de estudos já realizados pela Aedas (Assessoria Técnica Independente nas Regiões 1 e 2 da Bacia do Paraopeba*) e mostram que existe um número muito expressivo de crianças expostas a metais pesados. 

Os exames foram realizados em 2021 e indicaram a contaminação de adultos e crianças por níveis elevados de chumbo, arsênio, manganês, mercúrio e cádmio. Os resultados foram apresentados aos moradores em fevereiro deste ano. “O nível de chumbo na minha filha é 2,8 vezes maior do que o permitido. E fui ficando cada vez mais apavorado, pois 100% das crianças testadas tinham algum metal pesado no sangue, a metade delas num valor acima do recomendado”, desabafou o integrante da Comissão Pastoral da Terra, Alexandre Gonçalvez. 

Imagem de Laura De Las Casas/Guaicuy

Dom Vicente fez uma provocação sobre o modelo de desenvolvimento predatório, que não se importa com a vida das pessoas. “Tenho convicção de que não teremos um corpo saudável em um planeta doente”, disse o líder religioso. Valéria Silva, moradora do assentamento Pastorinhas, em Brumadinho, que foi atingido pela Vale, fez uma fala forte, salientando como é difícil sempre voltar a tratar do assunto. “Crianças com menos de um ano com metais pesados em suas correntes sanguíneas é revoltante”, afirmou. 

Questão de prioridade

Carmem Fróes, da UFRJ, questionou como a sociedade é capaz de extrair minério para transformá-lo em carro, computador e celular, mas ainda não é capaz de fazer isso sem contaminar e matar pessoas. Ela também falou sobre a importância em se pensar e investir em um modelo de sistema de saúde que considere a realidade de cada território. “O processo de vigilância em saúde deve estar atento a isso, se adaptando ao que o território está precisando. Se é um lugar dominado pela mineração, o sistema deve ser preparado para isto”, comentou. 

Shirlene Gerdiken, representante da comunidade de Aranha, em Brumadinho, questionou qual o limite entre exposição e contaminação e lembrou da responsabilidade do Estado em dar respostas e proteger a população. “Por que estamos prejudicando nossas crianças? Serão várias gerações comprometidas. Qual a prioridade? Um modelo de mineração que gera lucro para poucos e a vida de tantos deve seguir acontecendo?”, criticou. 

Ísis Taboas, da Aedas, apresentou um panorama geral da série de pesquisas feitas pela ATI em Brumadinho, mostrando como o próprio Sistema Único de Saúde (SUS) registrou o aumento expressivo de atendimentos por questões de saúde física e mental no território após o rompimento. O atendimento por questões de estresse foi 13 vezes maior, por exemplo, comparado aos anos anteriores ao rompimento. 

*Regiões atingidas pela Vale e suas Assessorias Técnicas:

Regiões afetadas pelo desastre-crime da ValeMunicípios atingidosAssessorias Técnicas Independentes (ATIs)
Região 1BrumadinhoAedas
Região 2Betim, Igarapé, Juatuba, Mário Campos e São Joaquim de BicasAedas
Região 3Esmeraldas, Pará de Minas, Florestal, São José da Varginha, Pequi, Maravilhas, Papagaios, Fortuna de Minas, Caetanópolis e ParaopebaNACAB
Região 4 Curvelo e PompéuInstituto Guaicuy
Região 5Região da Represa de Três Marias: Abaeté, Biquinhas, Felixlândia, Martinho Campos, Morada Nova de Minas, Paineiras; São Gonçalo do Abaeté e Três Marias (as duas últimas banhadas pelo Rio São Francisco).Instituto Guaicuy



Texto de Laura de Las Casas e Mathias Botelho

**Com informações de Aedas e ALMG. 

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