Caso Brumadinho: Instituições de Justiça e Assessorias Técnicas Independentes assinam Termo de Compromisso que contempla as atividades do Acordo

Documento garante o direito das pessoas atingidas pelo desastre-crime da Vale à Assessoria Técnica Independente pelos próximos 30 meses, mas reduz o orçamento para as Regiões 4 e 5

Nesta segunda-feira (17), as Instituições de Justiça (IJs) e as Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) assinaram um Termo de Compromisso referente às ações de acompanhamento do Acordo de Reparação. A assinatura do Termo garante o direito das pessoas atingidas à assessoria pelos próximos 30 meses, indicando a necessidade de ajustes no Plano de Trabalho, mas trazendo segurança jurídica para a manutenção dos trabalhos junto às comunidades do Rio Paraopeba e Represa de Três Marias. 

Além de questões formais do trabalho das ATIs, como prestação de contas, o Termo de Compromisso também impõe mais um corte de recursos para as Assessorias. No caso do Guaicuy, houve redução de orçamento de 12% para a Região 4 e de 15% para a Região 5. A diminuição poderia ter sido maior, não fosse a luta e pressão das pessoas atingidas junto às IJs nos últimos dias, como foi o caso do coletivo Guerreir@s, que se manifestou contra os possíveis cortes. O Instituto Guaicuy também argumentou, por meio de reuniões e de um ofício, destacando os desafios específicos das Regiões 4 e 5 e evidenciando que o corte inicialmente proposto poderia significar a exclusão de comunidades do alcance do trabalho da ATI.

Marcus Vinícius Polignano, diretor do Instituto Guaicuy, considera importante para o trabalho das Assessorias a assinatura do Termo. “É um documento que todas as ATIs buscavam para dar segurança jurídica à nossa atuação. A distribuição dos recursos é um fator muito sensível às Assessorias, porque implica diretamente nas condições do atendimento às comunidades atingidas. Ao final, a gente buscou que as Regiões 4 e 5 não ficassem sem os recursos mínimos necessários para manter o funcionamento do trabalho, especialmente no momento em que vão ser discutidos os projetos de demandas das comunidades previstos no Anexo 1.1 do Acordo. O Termo, se, por um lado, não é o que desejávamos, por outro nos dá o mínimo necessário para que não haja prejuízo ainda maior no atendimento das comunidades atingidas”, avalia.

O que diz o Termo de Compromisso?

As Instituições de Justiça definiram o prazo de 30 meses (até dezembro de 2025) e o orçamento global para as atividades das ATIs relativas ao Acordo no Projeto Paraopeba. O valor máximo estipulado para o trabalho das três ATIs durante os 30 meses é de R$150 milhões

O valor foi dividido da seguinte forma:

Região 1: 21%

Região 2: 25%

Região 3: 23%

Região 4: 10,5%

Região 5: 20,5%

Para a Região 4 (Pompéu e Curvelo), o valor total, ao longo dos 30 meses, será de R$15,75 milhões. Já para a Região 5 (entorno da Represa de Três Marias), o orçamento será de R$30,75 milhões. 

No total, as Regiões 4 e 5, assessoradas pelo Guaicuy, terão direito a 31% do recurso. No último ano, o repasse para as Regiões 4 e 5 somadas equivalia a 36,16% do recurso. Portanto, houve uma perda de 5 pontos percentuais ou uma redução de 14,27% em relação ao critério anterior.

O orçamento das assessorias será custeado pela fatia do Acordo destinada às estruturas de apoio, para as quais foram destinados um total de R$700 milhões. Segundo as Instituições de Justiça, o montante deve ser dividido entre auditorias diversas, estruturas públicas de apoio e as ATIs. Mas, até o momento, somente o valor destinado às ATIs foi delimitado e divulgado. 

Considerando que a definição do orçamento global e os novos percentuais de divisão deste orçamento entre as ATIs alterou o orçamento que estava sendo considerando desde o último Plano de Trabalho e desde o corte de março de 2023, as ATIs deverão apresentar mais uma vez novos Planos de Trabalho para adequação à nova realidade orçamentária. 

O prazo para elaboração de novos Planos às Instituições de Justiça é de  60 dias, sendo que as IJs analisarão os Planos em até 30 dias e darão outros 30 dias às Assessorias para eventuais modificações. Durante esses dois meses em que as Assessorias construirão os Planos de Trabalho, as pessoas atingidas serão consultadas sobre o andamento do processo, que contará com o apoio e seguirá orientações da Coordenação de Acompanhamento Metodológico e Finalístico (CAMF) Lataci. 

O Termo ressalta que o custeio do trabalho da CAMF não está incluído no orçamento definido para as ATIs. 

Imagem de Pedro Lavigne/Guaicuy

Atividades mínimas

As IJs optaram por formalizar no Termo duas atividades mínimas que devem ser prestadas pelas ATIs no acompanhamento do Acordo. São elas: 

  1. Apoio técnico e organizacional na definição dos projetos de interesse das comunidades, no âmbito do Anexo 1.1; 
  2. Apoio na participação das comunidades autorreconhecidas como Povos e Comunidades Tradicionais (PCTs) contempladas com projetos, no âmbito das etapas decorrentes da Consulta Popular específica (Anexos 1.3 e 1.4); 

As ATIs sugeriram que fosse incluída uma terceira atividade, destacando a promoção da participação informada, finalidade primordial das ATIs. As ações concretas ainda serão descritas nos Planos de Trabalho a serem apresentados, mas a terceira atividade foi incluída no termo:

  1. Apoio à participação informada das pessoas atingidas, na defesa e garantia de seus direitos quanto à execução e cumprimento dos termos do Acordo Judicial e seus respectivos anexos.

O Termo de Compromisso ressalta que os “serviços das ATIs a serem custeados com recursos da Cláusula 4.4.11 do Acordo Judicial envolvem exclusivamente o objeto do presente TERMO, sendo que quaisquer outras atividades relacionadas ao processo judicial em curso seguirão rito e fonte de custeio distintos e baseados em decisões judiciais”

Isso significa que as atividades das ATIs de acompanhamento a outras atividades da reparação integral, como a resolução das indenizações individuais (tema não resolvido pelo Acordo), não são objeto do Termo de Compromisso e, tampouco, serão financiadas pelas verbas definidas no Acordo. 

O Instituto Guaicuy segue esperando a aprovação do Plano de Trabalho referente ao Processo Judicial, que já foi entregue às IJs e apresentado em Juízo. Também, espera novas definições quanto ao processo de resolução dos danos individuais para, se for o caso, apresentar outro Plano de Trabalho específico às IJs. 

Quer saber mais sobre os 3 Planos de Trabalho? Acesse a matéria completa aqui. 

O contexto da assinatura do TC

Desde que o Acordo foi firmado entre Vale e Poder Público, em fevereiro de 2021, as ATIs estavam trabalhando no processo de reparação sem definições formais de funções e orçamento. Tal insegurança foi evidenciada quando, no início de 2023, o repasse financeiro semestral das ATIs foi cortado em cerca de 48%. A situação levou o Instituto Guaicuy a reestruturar parte de suas atividades e a demitir 40 trabalhadores, além de ajustes e cortes já vinham sendo feitos desde janeiro, resultando na redução total de 80 profissionais no quadro da ATI em 2023. 

Desde então, com apoio das pessoas atingidas, de parlamentares e representantes da sociedade civil, as ATIs intensificaram as denúncias e reivindicações por mais transparência e por garantias mínimas de direitos. Para isso, havia a necessidade de um novo Termo de Compromisso, de um Plano de Trabalho e de um Orçamento Global, que dessem condições às Assessorias de realizar um planejamento responsável das atividades. É importante destacar que as ATIs são uma conquista e um direito das pessoas atingidas pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho.

O Instituto Guaicuy lançou à época o “Manifesto pelo direito à Assessoria Técnica Independente” e colheu quase 5 mil assinaturas. Entre os signatários, estão 21 Comissões de Pessoas Atingidas das Regiões 4 e 5, 7 deputados federais, 4 deputados estaduais e 89 entidades e movimentos sociais. 

Uso de reservas financeiras

Mesmo com os cortes ocorridos em março/2023 e com a insegurança, o Guaicuy foi capaz de manter suas atividades como ATI porque trabalhava com uma reserva financeira que possibilitava o custeio das atividades, considerando os frequentes atrasos nos repasses dos recursos. Os custos dos meses de janeiro, fevereiro e março foram pagos com a reserva que o Instituto tinha. Já os meses de abril, maio e junho foram custeados com o repasse recebido no mês de abril (com o corte orçamentário indicado).

Desta forma, o corte de março também obrigou o Guaicuy a consumir suas reservas financeiras mínimas.  Neste contexto, a assinatura do Termo de Compromisso, a definição de Orçamento Global e a garantia de não ter atraso nos repasses semestrais são essenciais para a boa gestão dos recursos, continuidade e planejamento das atividades de Assessoria Técnica Independente.

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