Guaicuy leva resultado de Cartografia Social para as comunidades atingidas

O Guaicuy se prepara para retornar às comunidades os resultados de mais uma das metodologias aplicadas para caracterização dos territórios e identificação de danos nas comunidades atingidas pelo rompimento da Barragem da Vale. Desta vez, são os resultados das oficinas de cartografia social. O Instituto deve levar os boletins com os resultados dos mapas feitos pelas comunidades a partir do mês de setembro. 

Os mapas e desenhos das comunidades foram feitos a muitas mãos pelas pessoas atingidas e dão conta de demonstrar os caminhos rasurados pela lama da Vale e seu desejo de mineração e lucro, que mudaram o curso de muitas vidas. Assumindo o ofício de cartografar a própria vida e seu lugar, durante as oficinas, os/as comunitários/as, as pescadoras e pescadores retratavam as dinâmicas sociais, o trabalho com a pesca, além de apontar os danos sofridos após o rompimento. 

Peixes de variadas espécies, cores e tamanhos, relevos feitos com traços finos em marrom, a ondulação das águas em muitos traços de azul dão lugar ao mapa das comunidades atingidas nas oficinas que aconteceram entre os meses de setembro e dezembro de 2021. 

Fosse Toquinho, artista que eternizou a música aquarela, diria que com um lápis azul seria fácil fazer uma represa ou um rio. Mas não é. O azul da água que resplandecia com seus espelhos d’água a atrair turistas, passaram a uma cor marrom, essa mudança também foi retratada pelos moradores nos desenhos. 

Difícil mesmo é retratar os impactos de um rompimento que sai devassando por quilômetros os cursos d’água. “Faltou representar o minério de ferro que sai corroendo tudo”, disse um dos atingidos durante uma das oficinas de Cartografia Social. Ele se refere à insegurança em relação ao rejeito de minério na água, no caso das comunidades à beira da Represa de Três Marias. 

Cartografia Social aponta danos na cadeia da pesca 

A cartografia social aplicada pelo Guaicuy teve o objetivo de entender especificamente os danos individuais e coletivos de pescadoras e pescadores artesanais e de subsistência, trabalhadoras e trabalhadores da cadeia da pesca. Importante ressaltar que a metodologia não foi aplicada em todas as comunidades assessoradas pelo Guaicuy. Todavia, as oficinas aconteceram em uma amostra expressiva nas comunidades das regiões 4 e 5. 

Segundo o relatório da equipe de Agrárias do Guaicuy, a partir da Cartografia Social “Foi possível avaliar conjuntamente as alterações dos locais de pesca, a variação das espécies pescadas e a mudança nos valores recebidos pela venda de cada uma delas”, pontua.   

Durante as oficinas os/as moradores/as apontaram danos à sua renda, queda na venda de peixe, sumiço de peixes, queda na economia que girava em torno do turismo, impactados à produção agrícola e pecuária, impactos nas relações comunitárias. 

Diante de tantos danos a lucidez de quem vive em trocas saudáveis e justas com a natureza entende que nem tudo é dinheiro. “As empresas pensam que é só pagar, não é só a indenização para quem foi lesado. E a natureza como que fica? Precisamos da natureza para sobreviver, se não tiver o rio limpo, como vamos sobreviver? não é só os peixes não. O dinheiro vai acabar, a natureza não pode acabar não. A Justiça tem que ser mais rígida com eles”, declara uma pessoa atingida durante uma oficina. 

Os boletins das cartografias sociais podem ser acessadas:

O que é Cartografia Social e como ela pode contribuir na reparação? 

A cartografia Social é uma metodologia que permite a participação comunitária no processo. Por meio dela, é possível que as pessoas retratem e reconheçam aspectos de seu lugar, trabalho e modo de vida,  através dos  mapas elaborados coletivamente. 

E como esta metodologia pode ajudar na reparação? Por meio desse exercício foi possível evidenciar danos relacionados à renda, à segurança e soberania alimentar, aos serviços ecossistêmicos, ao lazer, direito ao trabalho e ao modo de vida sociocultural daqueles que viviam da pesca e dos diversos serviços relacionados a ela em todo território atingido. Desta forma, os danos relatados  podem constar no processo de reparação. 

Durante a realização das oficinas a equipe do Instituto Guaicuy percebeu que algumas pessoas se sentem muito inseguras quando são informadas que elas mesmas devem realizar os desenhos de seus lotes, terrenos, construções, unidades produtivas, entre outros, e argumentam que não possuem estudo suficiente ou capacidade técnica para elaborar os mesmos. 

Para o coordenador da equipe de Ciências Agrárias, Felipe Ribeiro, “é importante reforçar que não se espera desenhos técnicos, artísticos ou extremamente elaborados, mas sim, uma representação espacial através do desenho daquilo que era importante para cada família ou comunidade, para que possamos compreender melhor o modo de vida e as relações e, assim, criarmos mecanismos para instrumentalizar a luta por uma reparação mais justa”, afirma. 

Assim sendo, as cartografias sociais podem ser desenvolvidas de diversas formas: como um instrumento jurídico dentro de processos de lutas e disputas por identidades e territórios tradicionais. Além disso, a cartografia social é o retrato vivo da vida das pessoas atingidas, possibilidade de fazer memória de seus territórios. 

Oficinas focam o cotidiano da cadeia da pesca e os impactos do rompimento 

A equipe adaptou a metodologia para abranger as pessoas atingidas que têm como principal função o ofício da pesca. Este Tal grupo de atingidos vivencia uma situação de extrema vulnerabilidade, com a ausência de um lugar seguro e acessível para desempenhar suas atividades de trabalho, como era anteriormente ao rompimento da barragem da Vale.

A cartografia social foi realizada pela equipe de Ciências Agrárias em parceria com as equipes do Acolhimento multidisciplinar (Saúde e Assistência Social, e Direitos), Ambiental e de Mobilização Social do Instituto Guaicuy.

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