Contrariando decisão judicial, Vale avança com negociações individuais e remoções em Itabira (MG)

Justiça não acata solicitação da Vale para extinguir processo por violações aos direitos das pessoas atingidas do município. Ainda assim, mineradora executa ações não pactuadas judicialmente

Na sexta-feira (3), a juíza responsável por julgar a Ação Civil Pública (ACP) contra a Vale por danos investigados em Itabira não acatou solicitação da empresa para extinção do processo. A ACP, ajuizada em 25 de abril pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), tem o objetivo de garantir a reparação integral dos danos causados às pessoas atingidas pelas barragens de mineração e diques pertencentes ao Sistema Pontal, localizado em Itabira (MG). 

A mineradora argumentou, em pedidos feitos em 23 de maio, que o MPMG estaria se baseando em “possíveis danos futuros e hipotéticos”. Além disso, a Vale afirmou que tem se reunido com a comunidade local e que mantém diálogo com a Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG) para executar suas ações na região e construir um “Termo de Compromisso” sobre as remoções em Itabira.

A juíza responsável não acatou as solicitações da empresa e determinou a continuidade da Ação Civil Pública. Nessa ACP, inclusive, consta solicitação do MPMG para que a Vale custeie o trabalho de uma entidade que possa prestar assessoria técnica independente às pessoas atingidas. E também que seja determinado que a Vale proceda com medidas emergenciais para atender às famílias que precisarem ser removidas de suas residências. 

Além de não extinguir a Ação, a decisão proferida pela juíza acata várias solicitações feitas pelo Ministério Público, determinando que:

a) A Vale terá que trazer provas às suas refutações contra laudos ou relatórios do Ministério Público, da Auditoria Técnica e da Assessoria Técnica Independente.

b) A Vale deve interromper as negociações individuais com as pessoas atingidas, de acordo com a Lei Estadual dos Atingidos por Barragens (PEAB).

c) A Vale deverá custear a assessoria técnica independente para as pessoas atingidas como forma de garantir a participação e informação da comunidade, que será responsável por escolher a entidade. 

d) A Vale deverá custear a perícia que irá definir as ações de mitigação e prevenção de danos e impactos socioeconômicos, dentre outras, como a definição dos parâmetros de indenização.

e) Em caso de necessidade de remoção ou evacuação emergencial e compulsória das pessoas atingidas antes da conclusão do processo de reparação integral, a Vale deverá garantir moradia digna e adequada, custear as despesas com transporte dos bens das pessoas atingidas e providenciar que os imóveis desocupados estejam protegidos contra saques e roubos, além de pagar aos proprietários valores referentes a IPTU, energia e água. A mineradora deverá, também, custear as refeições das pessoas alojadas em pousadas e hotéis. 

Negociações individuais e remoções em Itabira

Até então, a Vale não apresentou no processo nenhum recurso à decisão dada pela Justiça. Pelo contrário, a população de Itabira foi surpreendida com a notícia de que a mineradora assinou o “Termo de Compromisso” com a Defensoria Pública para realizar a remoção de famílias e proceder com as negociações individuais.

Segundo informações veiculadas pela imprensa na segunda-feira (6), o documento assinado com a DPMG sinaliza o início do processo de remoção de 11 famílias que residem nos bairros itabiranos de Bela Vista e Nova Vista. Esses bairros fazem fronteira com a barragem do Pontal, em que sete estruturas alteadas a montante devem ser descaracterizadas. 

De acordo com o membro do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração de Itabira e região, Leonardo Ferreira, apesar de trágica, essa não é uma postura inédita da mineradora. “É muito estranho uma juíza ter que publicar uma decisão dizendo que a lei deve ser cumprida. A Vale tem infringido sistematicamente os direitos das pessoas atingidas em Itabira, principalmente os regulamentados pela PEAB [Política Estadual dos Atingidos por Barragens]. Tanto em relação à transparência das ações que tem executado, quanto ao cronograma de quando as coisas vão acontecer. A comunidade vive um clima de tensão cotidiana”, afirma Ferreira.

As famílias citadas no “Termo de Compromisso” haviam sido notificadas da remoção no final do ano passado e permaneceram sem esclarecimentos até este mês. A falta de critérios e de detalhes, de acordo com Ferreira, têm causado ansiedade e aflição em quem vive na cidade. O Instituto Guaicuy se solidariza com as pessoas atingidas em Itabira e alerta para a necessidade de que a população possa ter materializado o princípio de paridade de armas no processo contra a Vale, para que seus direitos sejam integralmente reparados e que as violações não aconteçam mais.

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